EM FOCO

Políticas econômicas devem considerar o trabalho não remunerado das mulheres

Foto: Carlos Vera/CEPAL

O trabalho não remunerado das mulheres representa uma grande porcentagem do PIB dos países da América Latina e do Caribe, mas pouquíssimos países conseguem atribuir-lhe valor e quantificá-lo. A inexistência de estatísticas sobre o tempo dedicado a tarefas de cuidado fez com que esta área tenha se convertido em um "gigante invisível" e, portanto, não seja considerada na maioria das políticas públicas.

No entanto, a situação na região vem mudando paulatinamente, graças aos esforços realizados por grupos feministas, centros de estudos e governos, que vieram incorporando medidas para que este fenômeno seja mais visível e receba a importância que lhe corresponde dentro das economias.

Este tema foi analisado por destacadas expertas internacionais na conferência "La economía política de la igualdad de gênero", realizado na sede da CEPAL no dia 1o de dezembro.

Ao abrir o encontro, Alicia Bárcena, Secretária-Executiva desta comissão regional das Nações Unidas, destacou a importância de avançar para que a economia política da igualdade de gênero permeie todo o espectro da sociedade e se instale como peça fundamental das políticas macroeconômicas.

"É importante romper o silêncio estatístico para que se saiba realmente quanto tempo as mulheres dedicam a tarefas de cuidado (de crianças, anciãos e deficientes)", observou. "Avançou-se muito, mas falta… É preciso que os conceitos de gênero permeiem todas as políticas públicas dos Estados", enfatizou.

María Ángeles Durán, Professora do Centro de Ciências Humanas e Sociais do Instituto de Economia, Geografia e Demografia da Espanha, enfatizou que não se investiu o suficiente para medir o "enorme esforço em tempo de trabalho" que as mulheres realizam fora do mercado.

"Necessitamos uma mudança radical do marco da análise macroeconômica. Temos de incorporar aqueles recursos que não têm preço, como o trabalho não remunerado das mulheres", disse.

Como exemplo, assinalou que na Espanha estas tarefas, se incorporadas às medições oficiais, corresponderiam a 53% do PIB. Neste sentido, advogou pela incorporação do tempo como uma variável nas políticas públicas e nos serviços, como o transporte e a saúde.

Devaki Jain, Economista do Institute of Social Studies Trust, da Índia, também destacou o valor do trabalho não remunerado das mulheres. "Acreditamos que as mulheres, por meio deste trabalho não remunerado, podem gerar crescimento", declarou.

A especialista apresentou uma análise do cenário presente na pós-crise mundial (2008), na qual a cooperação Sul-Sul adquiriu grande relevância. "Este é o tempo para a democracia econômica e social, e isso implica considerar as ideias das mulheres sobre como reconstruir o mundo", observou.

"A igualdade entre os gêneros não pode ser considerada em forma isolada. Deve formar parte das políticas econômicas e mudar o sentido das próprias políticas", precisou.

Indira Hirway, Diretora do Centro de Alternativas para o Desenvolvimento, da Índia, realizou uma análise profunda do conceito de trabalho não remunerado e de como este afeta o bem-estar das sociedades e das economias em geral.

Explicou como o trabalho não remunerado subsidia a economia de mercado, uma vez que reduz o custo do trabalho e o montante destinado a salários e, ao mesmo tempo, incrementa os lucros e a acumulação. "Se não houvesse trabalho não remunerado os empregadores teriam de pagar salários mais altos a seus trabalhadores, reduzindo seus lucros", observou.

Sonia Montaño, Diretora da Divisão de Assuntos de Gênero da CEPAL, encerrou a conferência destacando o fato de que o pensamento sobre a igualdade de gênero tem progressivamente sido incorporado à esfera pública.

Efetuou também um repasse das principais ideias debatidas durante a Cuadragésima sexta reunión de la Mesa Directiva de la Conferencia Regional sobre la Mujer de América Latina y el Caribe, realizada de 28 a 30 de novembro na sede da CEPAL, e à qual assistiram ministras e autoridades da mulher de 19 países da América Latina e do Caribe, e no Seminario internacional. Políticas de tiempo, tiempo de las políticas, que abordou a forma como os homens e as mulheres vêm distribuindo seu tempo, considerando o trabalho remunerado, as tarefas domésticas e outras atividades cotidianas.

Montaño observou que é de vital importância gerar um discurso genuíno de igualdade "que repouse no conceito de trabalho total, que implica a produção de bens e serviços na esfera pública e privada". "É preciso mudar a noção do trabalho como algo associado apenas a salário e renda", enfatizou.

Destacou também o fato de que alguns países da região já estejam construindo estatísticas de uso do tempo, em vista da grande demanda gerada pelas atividades de cuidado. No entanto, enfatizou que não ser suficiente demonstrar a igualdade com dados, mas que se devem apresentar argumentos para incentivar a participação das mulheres em todas as esferas.

 


 

 


 

 

 

 
 
  A economia política da igualdade de gênero deve permear todos os níveis da sociedade e instalar-se como peça fundamental das políticas macroeconômicas.
 
 
  Alguns países da região já estão construindo estatísticas de uso do tempo, em vista da grande demanda gerada pelas atividades de cuidado.